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Responsabilidade social corporativa e a ética nos negócios

Responsabilidade social corporativa e a ética nos negócios

Publicado em:
29
/
11
/
2023

O papel das organizações e o impacto que provocam na sociedade e no ambiente em que operam é um dos temas atuais mais discutidos na agenda dos negócios. Frequentemente nos deparamos com notícias veiculadas pela mídia sobre um dano ambiental provocado por uma má conduta corporativa ou, por outro lado, sobre uma contribuição positiva, como a descoberta de uma nova vacina ou uma invenção que irá mudar a forma como as pessoas trabalham e interagem entre si, para citar alguns exemplos.

Diante da repercussão dessas notícias junto à opinião pública, as empresas perceberam que agir de forma correta, ética e transparente é a única maneira de crescer e prosperar de forma sustentável e contínua. Atualmente, não há um único setor ou empresa que não tenha experimentado uma pressão por legitimar sua atuação perante a sociedade, demonstrando que opera de forma responsável, não apenas em relação ao meio ambiente, mas também em relação aos seus empregados e demais stakeholders1. As organizações, portanto, passaram a responder a essa demanda com uma agenda de responsabilidade corporativa.

Mas o que significa Responsabilidade Corporativa (RC) ou Responsabilidade Social Corporativa (RSC)?

O que é responsabilidade social corporativa?

A RSC corresponde à maneira pela qual as empresas se relacionam com a sociedade onde operam e compreende as políticas e práticas empregadas pelas mesmas, permitindo a consecução de objetivos sociais e ambientais também desejados por seus stakeholders

O conceito de RSC envolve aspectos econômicos, legais, morais e até filantrópicos da atuação corporativa que devem estar articulados e inter-relacionados entre si. Isso significa que uma empresa responsável  deve atuar com o objetivo primordial de produzir bens e gerar lucro, operando, não apenas dentro da lei, mas também conforme parâmetros morais definidos pelas expectativas da sociedade em que atuam. Há ainda uma dimensão ampliada da atuação ética que vai além das expectativas da sociedade sobre como devem agir.  Essa atuação corresponde às escolhas individuais que cada empresa faz, voluntariamente, para perseguir fins sociais, que são as contribuições a causas filantrópicas, como fomento à educação, curadorias culturais, entre outras.

Embora o conceito de RSC tenha sido cunhado nos anos 70, muito antes desta época, o assunto já era debatido no mundo corporativo. Para se ter uma ideia, Frank Adams, ex-executivo da Standard Oil Compay já em 1951, defendia que as empresas deveriam pensar não apenas em lucros, mas também em seus empregados, clientes e no público em geral2. Na Índia, a Tata, uma empresa centenária do setor automobilístico, alega mais de 100 anos de práticas responsáveis, desde iniciativas filantrópicas a projetos sociais nas comunidades onde opera.

Ao longo do tempo, mais e mais empresas, públicas ou privadas, de vários tamanhos e localizadas em diferentes países têm implementado suas iniciativas de RSC.

Elementos da responsabilidade corporativa

Mas como ser uma empresa socialmente responsável? 

Há 6 elementos essenciais que caracterizam a Responsabilidade Corporativa.

A responsabilidade corporativa é voluntária

Uma empresa responsável possui uma atuação pautada por normas que vão além do cumprimento da letra fria da lei. Empresas responsáveis consideram as expectativas da sociedade sobre como devem agir para estabelecer, voluntariamente, padrões de comportamento mais elevados para orientar suas atividades.  Nesse sentido, elaboram seus códigos de ética e conduta e um conjunto de políticas para estabelecer padrões de comportamento esperados de todos os stakeholders para pautar e orientar suas ações em nome da empresa. 

Internalização e/ou gerenciamento de externalidades

Externalidades são os efeitos colaterais positivos ou negativos produzidos pela atuação da empresa na sociedade e que são suportados por terceiros, não sendo considerados na formação do preço dos bens e serviços oferecidos. Um exemplo clássico é a poluição gerada para produzir determinado produto, sendo a comunidade local afetada por tal externalidade. A RSC representa uma abordagem voluntária para endereçar essas externalidades, como por exemplo, realizar investimentos em tecnologias limpas de produção ou em créditos de carbono. 

Consideração dos interesses de vários stakeholders

A RSC trata de considerar os interesses de vários stakeholders, como empregados, clientes, consumidores, fornecedores e/ou de quaisquer outras pessoas afetadas pelas atividades da empresa e não apenas dos acionistas para definir os parâmetros de sua atuação. Um exemplo são as iniciativas empregadas na busca para diminuir as assimetrias de gênero nos seus quadros, como a ampliação da licença paternidade para seus empregados ou programas de treinamentos para inserção de mais mulheres em cargos de liderança.

Equilíbrio entre responsabilidades econômicas e sociais

É importante ressaltar que as práticas de RSC não devem ser incompatíveis com a geração de receita esperada. As iniciativas de RSC devem ser sustentáveis e gerar valor para a empresa. Vários investimentos corporativos são direcionados a programas de treinamento e formação de jovens para determinado setor, como programadores, médicos e enfermeiros, por exemplo, de modo a formar profissionais para suas frentes de atuação.

Práticas e valores

As atividades das empresas responsáveis compreendem uma dimensão moral que vai além de meramente cumprir a lei para gerar seus resultados financeiros. Espera-se que a empresa também faça o certo porque é certo, impactando positivamente a sociedade, mitigando as externalidades negativas provocadas por sua atuação. A RSC portanto, compreende um conjunto de valores, políticas e práticas que pautam e norteiam a operação das empresas, estabelecendo normas que podem imprimir obrigações ainda não previstas em lei. Essas normas geralmente estão formalizadas em Códigos de Ética e Conduta e outras políticas específicas.

A RSC é mais que mera filantropia

Há algum tempo, havia quem advogava que a RSC seria mera filantropia e que as iniciativas implementadas, por serem voluntárias, estariam na esfera da discricionariedade, podendo ser canceladas a qualquer tempo, conforme o interesse da empresa. No entanto, o conceito atual e moderno de RSC significa mais que altruísmo. A RSC representa uma operação ética com práticas sociais e ambientais integradas nas atividades ordinárias da companhia. Embora as obrigações e compromissos assumidos não estejam previstas em lei, passam a ser exigíveis pela sociedade, por meio de instrumentos como naming and shaming3.

Por que se tornar uma empresa socialmente responsável?

Diversos estudos têm sido conduzidos para demonstrar  a autossustentabilidade da RSC. 

Essa questão revela-se de suma importância, não apenas aos administradores de uma empresa, que devem atuar para gerar valor aos acionistas, mas também aos acionistas, que desejam ver o retorno sobre seus investimentos. 

A sustentabilidade da RSC é também importante para os ativistas sociais, pois as empresas devem ser capazes de conduzir suas atividades dentro do que advogam tais ativistas. Ao mesmo tempo, as autoridades governamentais também têm interesse na sustentabilidade da RSC, uma vez que os resultados alcançados por meio dessas iniciativas voluntárias podem ser mais racionais do ponto de vista de custo-benefício, quando comparadas às iniciativas regulatórias impostas por lei. 

Há também uma pressão dos próprios consumidores por produtos produzidos por empresas responsáveis. Embora as grandes corporações possuam poder considerável para influenciar no gosto e nas preferências de consumo de seu público alvo por meio de atividades de marketing e inovação, atualmente se percebe que a sociedade também molda o comportamento das empresas.

Não raro, algumas empresas sofreram boicotes de seus clientes em razão de escândalos provocados por violações a leis trabalhistas e uso de trabalho escravo em seus processos produtivos em alguns países, por exemplo.

Ao mesmo tempo, certas escolhas hoje consideram a compra de produtos fabricados por produtores locais, orgânicos, ou fabricados com produtos biodegradáveis, não obstante seus preços serem mais altos.

Atualmente, a discussão sobre as vantagens de aderir a padrões de responsabilidade corporativa está pacificada. É de conhecimento geral que há vários motivos para se engajar na RSC, além dos potenciais retornos financeiros que tais iniciativas podem gerar. Esses motivos incluem:

  • redução do risco dos stakeholders se oporem aos interesses das empresas; 
  • aquisição de vantagens competitivas ao atender aos anseios e expectativas dos stakeholders
  • o desenvolvimento de boa reputação e legitimidade, como uma “licença para operar” por parte da sociedade; e, 
  • a busca de resultados vantajosos a todos, por meio de criação de valores sinérgicos, ao se conectar aos valores dos stakeholders. 

Regulamentação da responsabilidade corporativa

Diante da exigência da sociedade por uma atuação ética e transparente das empresas, o tema da responsabilidade corporativa não está mais restrito às grandes multinacionais, mas a todas as empresas que buscam crescimento sustentável e a aceitação de seus stakeholders.

Nas últimas décadas, as discussões sobre RSC que antes ficavam restritas ao âmbito dos negócios domésticos, chamaram a atenção das organizações da sociedade civil tanto nacionais como internacionais, bem como dos Estados para fomentar novos modelos de governança corporativa que fossem mais abrangentes em relação às responsabilidades assumidas pelas empresas.

Nesse sentido, os governos de diferentes países têm implementado medidas para fomentar uma atuação corporativa mais aderente às expectativas da sociedade. No Brasil, por exemplo, a lei 14.457 de 2022 foi editada para apoio à inserção e à manutenção de mulheres no mercado de trabalho. Outra iniciativa de destaque foi a instituição do selo Pró-Ética que tem por objetivo incentivar a adoção voluntária de medidas de integridade pelas empresas, como instrumento de prevenção, detecção e remediação de atos de corrupção e fraude. 

Paralelamente à atual agenda normativa dos Estados para fomentar práticas responsáveis pelas empresas, a sociedade civil também tem implementado suas iniciativas para colaborar com o avanço da RSC. Um exemplo é o Índice de Sustentabilidade Empresarial (“ISE”) criado em 2005 pela BM&FBovespa, atual B3, com financiamento do Banco Mundial.  O ISE tem como objetivo ser um indicador de desempenho da performance das companhias listadas em bolsa relativo às suas práticas de sustentabilidade, apoiando os investidores na tomada de decisão quanto à seleção de investimentos socialmente responsáveis. Destaca-se que o desempenho histórico das empresas constantes da carteira do ISE B3 encontra-se acima dos índices das demais carteiras, demonstrando que as práticas responsáveis de fato geram valor não apenas para os acionistas, mas para toda a sociedade.

Conclusão

Nesse contexto, assim como o consumo responsável, o investimento responsável tem buscado recompensar as boas e responsáveis práticas corporativas. A consideração de critérios sociais e ambientais na atuação das empresas tem contribuído para uma significativa institucionalização da responsabilidade corporativa. Isso significa que a RSC está se tornando uma prática usual e um aspecto esperado da governança corporativa e não mais um conjunto de atividades discricionárias das empresas, ampliando o impacto positivo que as mesmas exercem na sociedade e permitindo que sejam instrumentos catalisadores do bem estar social.